Corria o ano de 1963 e comecei a ir com ela e mais umas crianças da aldeia para esta escola. Íamos de manhã, na camioneta da EVA que ia para Beja e voltávamos na mesma, à tarde, depois das aulas. Quando estava bom tempo, para não termos de esperar, regressávamos a pé e lá íamos, a percorrer os três quilómetros e pouco (o que, diga-se de passagem era para nós uma festa).
Nessa altura a escola acolhia alunos oriundos de vários locais. Desde logo, os filhos dos ferroviários (a estação ficava mesmo em frente da escola e era uma alegria para nós ver passar o comboio, quando estávamos no recreio - nessa altura, ainda havia comboios e ainda paravam nesta estação). Entre essas crianças, estava a filha do chefe da estação, que terá sido a minha primeira paixão.
Havia ainda os filhos dos trabalhadores do Monte do Outeiro e de moradores de outros montes à volta. A antiga fábrica de cerâmica já estava desactivada, mas o bairro anexo ainda estava habitado.
Mesmo ao lado da escola, entre esta e a estação, havia a mercearia do senhor Costa, hoje habitação particular.
No ano lectivo seguinte, quando completei a idade legal para entrar na escola primária, fui para a escola da aldeia onde, graças a esse ano que passei na escola da estação, apenas estive três anos.
Com o decorrer dos anos e a diminuição das crianças, a escola encerrou e, embora o espaço à volta esteja abandonado, o edifício (pelo menos por fora) não parece estar muito degradado. Há alguns anos, a Câmara Municipal de Beja colocou-o à venda, tal como fez com outras escolas fechadas, tendo sido adquirido pelo actual proprietário da habitação/mercearia da senhor Costa.
Segundo ele me disse, já fez algumas obras e pretende recuperar totalmente o edifício, para uso pessoal.
Antes assim, do que degradar-se como aconteceu com o edifício da estação "velha" :
Na realidade, o estado a que chegou este edifício é uma vergonha. Melhor teria sido que a CP a tivesse demolido, para não apresentar este aspecto tão desolador, que estraga a paisagem envolvente.
Ao menos, com a estação "nova" tiveram o cuidado de entaipar portas e janelas, pelo menos para evitar vandalismos e a degradação do edifício. Esperamos que a vão conservando, nomeadamente a cobertura, para evitar outro crime contra o património.
Este post é dedicado ao meu antigo colega e amigo, o "Zé da Alagoa". Não sei se ele terá oportunidade de o ver, há muito tempo que não o encontro e, noutras alturas, quando estive muito tempo sem o ver, até receeie que algo de mal lhe tivesse acontecido, já que tem vários problemas de saúde. O nome ficou-lhe do facto de, nessa altura morar no Monte da Lagoa, de onde se deslocava para vir à escola.
Costuma parar junto á porta do Jardim Público, do lado do Governo Civil e, quando ali passo a pé e o encontro, ficamos a falar tempo sem fim. Conta-me sempre as mesmas histórias, do verdadeiro terror que era na altura, nas "barqueiradas" que atirava aos outros moços, nas malandrices que fazia com as meninas, das reguadas que a "Dona Maria Amélia" lhe dava quando passava das marcas.
Mas tudo isto me conta com um grande carinho, naquela sua vozeirona, o mesmo carinho e amizade que sinto por ele.
É um gosto que tenho, falar com o Zé da Alagoa, que insiste em me tratar por "engenheiro", embora já lhe tenha explicado que não o sou e que me trate também por Zé.
És engenheiro sim senhor! És de Santa Vitória, terra dos engenheiros! Também eu frequentei a escola da "estação". Ainda me lembro do primeiro dia de escola. Saí do bairro, onde morava, com um talego com alguns bolos para o lanche que a minha mãe meticulosamente confecionou. Claro que foram parar à barriga do Zé da Alagôa! Mas depois, ele que já devia ter uns 14 anos, lá protegia os mais novos e, até hoje, sempre que o vejo é uma grande alegria, apesar do estado de saúde dele não ser o melhor. Naquela altura, erámos vinte e tal alunos. Fizesse chuva ou frio, todos os dias lá chegavam miúdos do Cardal, do Moncorvo, da Chancuda, do Monte da Vinha, do Monte do Outeiro, das Represas (Casa da Guarda da CP), etç. Por essa altura, viveriam na herdade do Outeiro cerca de 200 pessoas (só no Monte da Vinha viviam 3 familias, num total de cerca de 20 pessoas). Depois quando o meu pai teve de emigrar fui viver para a aldeia (ano de 1969), mas continuei fiel à escola da Estação e, principalmente, à D. Maria Amélia. De manhã apanhávamos a caminoneta da EVA, conduzida pelo mestre Inácio e de tarde lá fazíamos os três quilómetros a pé. E a D. Maria Amélia ainda prosseguia a actividade, abrindo o quintal para dar explicações aos miúdos da aldeia. É claro que a retribuição apenas poderiam ser uns ovos ou uma galinha lá para o final do ano lectivo. Tive muitos professores ao longo da vida, mas a D. Maria Amélia foi sempre a minha professora mais querida pelo exemplo de entrega à causa e à profissão que abraçou. Aqui fica a minha homenagem para a grande pedagoga que foi a D. Maria Amélia que bem merecia que o seu nome constasse numa das ruas da nossa aldeia!
ResponderEliminarJoão Rosa
Amigo João, engenheiro como eu, como todos nós.
ResponderEliminarObrigado pela 2ª Parte do meu texto, que o completa e valoriza (e de que maneira). Isso deve-se a algo que eu não tenho, infelizmente, e que tu parece que tens para, dar e vender : uma prodigiosa memória. Vê lá, que queria colocar o nome do motorista da camioneta 90 (era, não era?) da EVA e não me lembrei : Inácio, sim senhor, era esse o seu nome.
Quanto ao nome na rua, concordo plenamente contigo. Quem sabe, um dia destes essa merecida homenagem se concretize.
Um abraço.
Zé Filipe